* Samuelita Santana
Pronto.
Feito. A "imprensa maldita" voltou a ser a grande
culpada. O presidente nacional do PT, Rui Falcão, em discurso essa semana numa
reunião da bancada classificou a imprensa de "oposição
extrapartidária". E avisou: o partido vai combater ostensivamente
"esse tipo de oposição". Leia-se:
vai insistir ostensivamente em implantar a tal "regulação da
mídia". E ainda há quem duvide que se trate de um despudorado eufemismo
para escamotear o termo censura. Há quem acredite tratar-se de um
"moderno" instrumento capaz de acabar com o monopólio dos meios de
comunicação. Então o pais virou menino! Façam-me o favor!
Falcão, em
seu discurso, disparou outras tantas bobagens como: "regular a mídia é
vital para o desenvolvimento do pais".
Outra: vital "para que
a liberdade de expressão se amplie". E, pasmem: que setores da mídia "desqualificam a
política" - ora vejam essa. A mídia
é quem desqualifica a política, não os atos de corrupção, a roubalheira
de dinheiro público, as manobras ardilosas para
manter- se no poder e a falta de compromisso com o país e com os
legítimos direitos de seus cidadãos. Não satisfeito, Rui ainda tasca terror
reportando-se às mazelas da ditadura que, pelo amor de Deus, não mais caberia
num país como o Brasil. Ele diz que se não houver regulação da mídia o país
corre o risco de sofrer “aventuras golpistas” e experimentar a volta do nazismo e do fascismo.
Diante disso
e, portanto, o objetivo do PT nessa conjuntura, segundo
Falcão, "é combater esse tipo de oposição, sem cara, mas com
voz". Ôpa! Não sendo isso censura, nessa tal conjuntura, chamaríamos de
que? Com certeza de garantir a sobrevida
e a manutenção do seu partido no poder. De preferência, sem qualquer tipo de voz
oposta. Até porque, no mesmo discurso, Falcão criticou a presidente da
Associação Nacional de Produtoras de Revista, Judith Brito, por ter dito que
como a oposição não cumpre o seu papel, a imprensa terá que fazê-lo. Falcão não
apreciou a assertiva. E ponderou: “E aqui, companheiros, sejamos francos. Quem
é a oposição real no Brasil hoje? A oposição parlamentar? Os partidos que fazem
oposição legitimamente? Há uma oposição mais forte e que não mostra a cara
quando poderia fazê-lo. É o que eu chamo de oposição extrapartidária".
Então é isso. Imprensa maldita, malvada, que escancara os “malfeitos” cometidos
pelos que pousam no poder.
Ao que parece, o "combate" criou
fôlego e asas após o julgamento do mensalão. E um dos réus, cassado e
condenado pelo Supremo Tribunal Federal, o ex-ministro da Casa Civil, Zé
Dirceu, saiu na quinta-feira, 31, em ardorosa defesa da candidatura de Renan
Calheiros (PMDB) para a presidência do Senado, classificando os protestos
contra a eleição do parlamentar como "ofensiva midiática" e
"falso moralismo". E, claro, Renan Calheiros não tem absolutamente
nada a ver com essa indignação que permeia sua candidatura. Pense num político
exemplar!
Mas o
arremate da semana, se não ocorrer algo novo, vem mesmo do ex-presidente Luís
Inácio Lula da Silva. Em sua visita ao capo Fidel Castro, em Cuba, Lula disparou
cheio de ironia: " Eu não reclamo, porque no Brasil, a imprensa gosta
muito de mim, só fala bem de mim… nasci assim, sou assim e vou morrer assim,
irritando eles”. Gabriela, cravo e canela, está quase perdendo. E
mais. Lula disse que a "elite" não gosta dele, como não gosta de
Fidel, condenou os "ataques midiáticos" e lamentou o fato de os
líderes da América Latina estarem de bobeira por não protagonizarem uma
verdadeira revolução na comunicação através da internet. " Não
precisaríamos mais pedir que publicassem o que queríamos", concluiu quase
profético. Acontece, presidente Lula, que o dever da imprensa não é publicar
o que os líderes políticos querem, mas o que a população - seja de que país for-,
merece e tem o direito de saber.
Volto a bater na mesma tecla. Qualquer
"marco" que queira limitar a atuação da imprensa no seu livre
exercício de informar é CENSURA. O resto é ferramenta anacrônica. É
inadmissível que os rumos do exercício de uma profissão sejam debatidos e
delimitados fora dela. Não é prerrogativa dos partidos definir o que será do
jornalismo brasileiro. Os partidos podem participar das discussões, como
qualquer outro segmento da sociedade, mas não engendrar, definir e pautar
comportamentos para a mídia. Muito menos é prerrogativa de partidos retirar da
profissão direitos constitucionais e inerentes à própria natureza do trabalho.
O jornalismo é composto por uma classe de profissionais. E tem suas próprias
técnicas, funções, regras e ética. E esse não é um conjunto perdido no tempo.
Mas fundamentado nas observâncias e dispositivos da Lei que regulamenta a
profissão. Portanto, o "marco regulatório" que querem cravar na
jugular da imprensa não tem outra serventia a não ser imobilizá-la para que não
atrapalhe projetos de domínio e poder. Os partidos devem estar atentos para
enxergar e captar as tendências e sentimentos do futuro.
*Publicado originalmente em O Jornal da Cidade.
Ilustração: Nani Humor
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